Jovuk tem forte senso de identidade artística, ele cria com o coração na ponta dos dedos e a cidade pulsando nos ouvidos. Seu som, um “pop urbano romântico”, é carregado de emoções cruas, atmosfera gelada e letras que podem ter saído direto de um diário. Em um cenário ainda desafiador para artistas independentes, ele constrói um universo próprio, onde drama, caos e amor convivem com liberdade estética e honestidade brutal. Nesta entrevista, Jovuk fala mais sobre seu álbum de estreia, Contraditório, sobre inspirações, processo criativo e a beleza das emoções.
Seu som mistura elementos urbanos com uma sensibilidade nas letras e melodias. Como você descreveria a essência da sua música para alguém que ainda não te conhece?
Adorei essa pergunta. Essa definição é muito boa, acho que é um pop urbano romântico. Acho que no final do dia eu sou uma pessoa muito apaixonada no geral, pelas coisas, e amo morar em centros urbanos, então eu sinto paixão por tudo no meu dia a dia, e aí eu tento misturar tudo isso. Pop urbano é um termo que me agrada, é um pop urbano romântico.

Além da música, você também se dedica a atuação no teatro, por causa disso seus lançamentos parecem sempre ter uma estética muito pensada, tanto nas capas quanto nos clipes e vídeos. Qual é o papel da parte visual no seu trabalho e como ela dialoga com as músicas que você cria?
A parte visual é muito importante pra mim, acaba elevando o nível do meu trabalho de certa forma. Eu gosto muito de pensar que cada música, não só as que eu faço, mas as que eu escuto também, tem seu próprio universo. Eu sou o tipo de pessoa que quando ouve uma música, vê cores, formatos, cenários, imagens… Quando comecei a fazer o meu som, eu queria muito passar essa atmosfera do que vinha na minha cabeça quando estava criando, quais as cores passavam pela minha cabeça com aquele instrumental e coisas assim. Pra mim, é muito importante, é uma oportunidade de criar um universo pra cada faixa e fazer com que a pessoa que está ouvindo se aproxime de alguma forma do meu produto, como arte mesmo.
Eu realmente acho que o visual consegue criar toda uma atmosfera para uma música e que quando você faz música com muito amor e com muita intensidade, automaticamente você tem esses sentimentos muito fortes. Você tem a cor que aquela música passa, você tem a atmosfera, você tem a temperatura, o clima, as roupas… tudo. Acho que música é isso, é contemplar o todo, é ser um momento que marca. Acho que o objetivo é sempre ser um momento, sabe? Uma era, uma memória, um momento que vai parar aquela pessoa e aquela música vai acompanhar ela por um tempo ou até mesmo pra sempre. Para o projeto eu trabalhei com o Pedro Cascardo, fotógrafo de Curitiba, e foi incrível e muito especial porque temos uma mente e uma forma de olhar para as coisas muito similar, o que ajuda muito a construir todo esse universo visual de uma forma coesa e coerente com meu eu artístico

Como é o seu processo criativo? Você começa pela letra, pela melodia, ou como funciona seu fluxo, é espontâneo ou pensado?
Geralmente eu começo ouvindo um som, entendendo o que aquele som me passa, e aí eu começo a escrever com base em vivências, com base no que eu tô sentindo, com base nas minhas emoções. Mas tiveram duas faixas durante o processo de composição do álbum que tudo aconteceu de forma muito mágica.
Sonhei com você foi uma música que eu comecei a escrever num café, eu não estava ouvindo nenhum som nem nada, só estava num café, numa tarde gelada aqui na minha cidade, Curitiba, e começou a vir a ideia. Eu escrevi ela enquanto eu estava tomando meu café, comendo e aí pedi uma caneta pra atendente porque eu estava sem nada, tava sem papel, eu tive que comprar o moleskine do café… e aí comecei a escrever, porque eu gosto muito de escrever manualmente, eu não gosto de escrever no celular ou no computador, eu gosto de rabiscar papel mesmo. E a ideia veio… comecei a gravar ali umas notas vocais, no celular mesmo, cheguei em casa e construí todo o restante. Foi um processo muito mágico porque veio muito rápido.
E bula foi a faixa mais especial de todas em termos de processo de composição porque veio de uma emoção muito grande, de um sentimento muito forte que eu tava sentindo e eu simplesmente botei um som pra tocar e em cima desse som eu comecei a gravar tudo que estava vindo na minha mente, foi uma música que eu não precisei nem escrever no papel, eu simplesmente liguei o gravador e comecei a falar tudo que eu tava sentindo, já musicalizando ali com aquele ritmo que eu estava ouvindo. Eu acho que bula foi a música mais rápida de se escrever, acho que levou exatamente o tempo que ela tem. E enquanto eu escrevia, eu ia cantando, cantarolando tudo que vinha na minha cabeça, teve choro, teve sensação de angústia, sentimento de saudade, foi um processo muito bonito e é uma música que eu tenho muito orgulho.
Suas músicas tem uma mistura de drama, caos e amor, e apesar dessa carga emocional tão pessoal, quem ouve suas músicas se identifica com o que você canta. Como você faz ou como acha que acontece essa conexão?

Eu acho que essa conexão acontece porque quando você faz algo com verdade, algo com propósito e com tudo que você sente, sem pensar, sem calcular, sem “ai, eu preciso ser assim” ou “ai, eu quero ser assim”, eu acho que é mais fácil das pessoas se identificarem e criarem uma conexão porque você tá sendo verdadeiro. Minha arte envolve muita verdade. Eu gosto de cantar sobre o que vivo, sobre o que eu sou, sobre o que eu penso. Eu não conseguiria ser um artista que se molda para cantar algo, para tentar agradar alguém, porque no final do dia eu faço arte porque eu tenho uma necessidade de me expressar, necessidade de materializar os meus sentimentos e criar algo em cima deles. Eu não faço com o propósito de “meu Deus, preciso que as pessoas se identifiquem”, se rolar a identificação é uma consequência, e é uma consequência genuína e bonita. Pra mim, é muito bonito quando eu vejo alguém falando “nossa, essa letra é exatamente o que eu tô passando”, “o que você escreveu nessa faixa é muito como eu me sinto”, isso me toca de um jeito muito lindo. Pra mim, é sempre sobre ser natural e sobre ser verdadeiro. A conexão só acontece se for realmente orgânica e genuína. Eu, na minha vida pessoal, pra eu me conectar com uma pessoa é muito difícil, eu preciso sentir muita verdade, então, eu, como artista, espero que as pessoas sintam essa verdade e se conectem por ela e não por qualquer outra coisa.
Em algum momento existe um limite entre o que você vive e o que transforma em música?
Acho que não existe um limite. Eu gosto de cantar sobre situações que eu vivo. Gosto de cantar sobre minha história. Pode parecer clichê, pode parecer milhões de coisas, mas é porque eu acho que como artista a gente tá sempre buscando inspiração e tudo que a gente vive acaba virando uma ideia, acaba virando alguma coisa. Eu acabo cantando muito sobre o que eu vivo. Acho que não tem muito um limite, né?
Obviamente eu não gostaria de expor algumas coisas pessoais de um jeito que seja talvez muito literal ou que talvez seja um jeito deselegante de se fazer. Eu quero ser um artista conhecido pela obra e não por qualquer polêmica ou por apelo, sabe? Eu gosto de cantar sobre o que eu vivo, inclusive, eu acho que eu não sou o artista que funciona cantando música dos outros. O processo de composição, pra mim, é muito importante, precisa fazer sentido pra mim. Eu não sei se eu conseguiria cantar música escrita por outras pessoas. Eu, como artista, gosto muito de compor, é uma parte muito importante pra mim.
Por que ‘Contraditório’?
O nome foi a primeira coisa que veio quando comecei a compor. Acho que veio porque desde jovem, nos meus 13, 14 anos, a minha frase favorita sempre foi “E se me contradigo? Tudo bem, então, me contradigo. Sou vasto, contenho multidões”. Eu sempre amei essa frase, e eu acho que eu fui entender e viver ela na vida adulta, e aí Contraditório surgiu e virou Contraditório. É um álbum que iniciou no momento em que eu estava entendendo como eu lidava com os meus próprios sentimentos em relação a começos e fins. E foi muito doido, porque eu vi que sou uma pessoa muito apegada ao passado, eu tenho muita dificuldade de deixar ir embora, tenho muita dificuldade de desapegar, mas ao mesmo tempo eu sou uma pessoa que quer muito viver o novo, que quer voltar pro começo, que quer sentir a adrenalina do desconhecido, então esse mix de emoções que sinto ao mesmo tempo foi o que deu essa ideia de contraditório. E principalmente porque eu percebi nos começos o quanto eu gosto dos fins e eu percebi nos fins o quanto eu gosto dos começos.

A capa de ‘Contraditório’ é muito bonita e a cor azul é predominante, na verdade faz bastante parte da sua estética. O que o azul representa no seu som e principalmente nesse álbum?
Azul é uma cor que combina muito comigo, sempre foi minha cor favorita, ela traz um ar de melancolia, mas ao mesmo tempo um ar de liberdade, um ar de calma. Eu gosto de brincar com esse sentido que o azul tem. É a cor que representa o frio, e acho que o frio é muito importante na minha sonoridade. Eu simplesmente sou apaixonado por friozão, por chuva, são os momentos em que eu mais me sinto inspirado, mais me sinto conectado com o meu eu, conectado com o universo, então o azul representa tudo isso, a imensidão, o infinito. O azul pra mim é uma cor mágica.
E acho que dentro da minha sonoridade consegue capturar muito bem a emoção que eu quero passar junto com a liberdade, junto com a autoestima, junto com o romance. Sou um artista que gosta muito de se sentir bem e confiante mesmo nos momentos de vulnerabilidade. Eu acho que a gente pode ser confiante mesmo vulnerável, a gente pode ser divertido mesmo triste, gosto de brincar com isso e o azul consegue contemplar muito bem esses meus dois lados, o meu lado mais vulnerável e o meu lado mais forte, eu sou um misto disso no meu dia a dia e aí eu acho que não tem cor melhor pra representar esse misto de melancolia e alegria. Porque o azul pode ser tudo, né? Pode ser um céu completamente gelado de inverno, mas ele também pode ser o mar num dia ensolarado. No meu caso, sempre vai mais pro lado do inverno.
‘Te alcançar’ foi sua primeira música lançada e é uma favorita dos fãs. Das novas faixas do álbum, qual você acha que vai mais alcançar um favoritismo e por quê? E qual a sua favorita?
Eu não faço ideia qual que as pessoas vão mais gostar, mas indo pela lógica de te alcançar, acho que as pessoas podem gostar muito de bula. Eu digo que bula é a irmã de te alcançar. Acho que elas são feitas meio que com a mesma proposta e com a mesma história, só que de uma visão e de uma perspectiva diferente, por isso que uma tá lá no começo do álbum, outra no final. Acho que te alcançar fala um pouco sobre a frustração de não ser visto e bula fala sobre aceitação do que foi lindo. Eu não acredito muito que as histórias tenham um fim. Eu não acredito muito que relacionamentos sejam ruins. Eu acho que é sempre muito bom, é muito bom amar, e bula é a música em que eu aceito o quão bom é amar e o quão bonito é viver coisas, mesmo quando elas acabam. Pode ser uma faixa que as pessoas gostem bastante.
E minhas favoritas do álbum é difícil. Eu amo o álbum inteiro. Mas acho que sonhei com você e te alcançar sempre vão ser muito especiais pra mim. E das novas, eu acho que tô pronto pra ser sua nova obsessão e bula talvez seja minhas favoritas. Tô pronto pra ser sua nova obsessão é muito divertida, eu me senti um divo pop, um artista popstar. E é uma canção que eu queria brincar com esse conceito de popstar, ser uma obsessão, então eu gosto muito dessa e espero que as pessoas gostem também.
Seu trabalho tem uma atmosfera pop com influências para além da sonoridade típica brasileira, quais são os artistas ou movimentos musicais que mais impactaram sua formação artística?
Eu adorei essa pergunta, meu sonho sempre foi responder isso.
Eu escuto muito, cresci ouvindo muito pop rock dos anos 90 por influência dos meus pais. Meus pais ouvem muita coisa dos anos 80 e 90, e meio que cresci consumindo isso. Roxette, eu amava, eu achava genial. Bandas tipo The Cure, Tears for Fears, são uma mega inspiração, uma mega referência pra mim, pra minha sonoridade. Cresci ouvindo isso em casa, é muito especial porque me lembra da minha infância, ouvir música com os meus pais. É muito especial pra mim tudo que envolve o que os meus pais ouviam, e os meus pais gostam muito desse som, acho que é o que mais me influencia. Aqui no Brasil, minha principal referência artística, com certeza, a Rita Lee, eu acho ela sensacional, tipo a maior artista brasileira, sou encantado por ela.
E o que eu ando ouvindo muito é Caroline Polachek e Charli XCX, acho que também acabam moldando muito a minha personalidade musical. Principalmente a Charli, tem muitas coisas no trabalho da Charli que eu gosto muito. Acho que se fosse pra dizer as minhas principais referências, e, assim, “você está ouvindo Jovuk, o que você pode esperar de Jovuk?”, eu colocaria que Tears for Fears encontra a Charli XCX num bar, depois eles saem numa noite gelada só pra tomar uma chuva com a Caroline Polachek, e depois esse rolê termina na casa da Rita Lee. Eu acho que esse seria um bom misto das minhas referências musicais.
Ah, e não posso deixar de falar do Jay Vaquer, que é pra mim uma mega referência, uma mega inspiração, pra mim ele é um professor, amo, sou encantado pelo Jay Vaquer. Então, pensa que todo mundo aí deu esse rolê, terminaram na casa da Rita Lee e o Jay Vaquer tava lá.

Você sente que a cena musical brasileira atual está mais aberta a artistas independentes, com propostas autorais que tocam em temas mais íntimos – e até vulneráveis – e sons como o seu?
Ah, infelizmente eu não sinto. Eu acho que a cena brasileira é muito complicada sendo um artista independente. Não é tão fácil assim, não é tão fácil receber apoio, é bem complicado na verdade, mas eu também não quero falar sobre o quão complicado é para não deixar essa entrevista pesada, mas eu tenho sentido que não é tão aberto não. Mas assim, eu sou uma pessoa que consome muito a galera que tá aí no corre, fazendo música, eu apoio muito os artistas independentes e acho que nós temos artistas talentosíssimos fora do mainstream. É um absurdo o quanto a gente tem de música moderna e fresh e autêntica sendo criada e longe do mainstream, e longe de ter grandes números, mas tem muita gente talentosa e eu tô muito orgulhoso da cena underground que tá sendo construída. Acho que tem artistas muito bons de São Paulo, aqui de Curitiba também, alguns que eu posso chamar de amigos, alguns que eu posso chamar de colegas e isso é muito legal, eu apoio muito todo mundo.
Se a gente espionasse suas notas de voz no celular, o que ia encontrar? Muitos rascunhos de músicas que não entraram no álbum, ideias para roteiro de clipe?

Sim, vocês encontrariam muitos áudios em que eu tento musicalizar coisas, eu ouvindo sons e fazendo melodias. Vocês iam encontrar uma faixa que não entrou pro álbum, saiu de última hora, chamada Gelo, que é uma faixa divertidíssima, engraçadíssima, talvez um dia eu lance ela, ela é dançante, ela é pop. Então, pode ser que vocês encontrem algumas coisas legais, sim. Mas a maioria são áudios meus vocalizando, pensando em melodias, pensando em palavras, em sonoridades, acho que a maioria é isso. E nas minhas notas comuns, vocês vão achar muito checklist. Eu amo fazer checklist, adoro fazer lista, adoro fazer ranking. Eu faço ranking até das pessoas que eu mais gosto para as que eu menos gosto no ambiente que eu tô. Eu adoro fazer rankings, então nas minhas notas vai ter muito ranking, eu amo ranking.
Se você pudesse viciar todo mundo em um álbum ou artista que você tem ouvido muito, qual seria?
Com certeza AKRIILA. Eu escuto muito pop chileno e ela é maravilhosa, sou obcecado por ela. O que eu mais tô ouvindo no momento é AKRIILA, Princesa Alba, Alex Anwandter, Francisco Vitória, eu realmente gosto muito do pop chileno, tem uma galera muito, muito, muito boa. Eu sou viciado no pop do Chile, acho que eles fazem música como ninguém. Inclusive, dá pra colocar eles nas minhas referências musicais porque me inspiram muito.
Uma pergunta que não pode faltar: qual o melhor álbum de 2025 até agora?
Pra mim, o álbum da AKRIILA [epistolares+] é o melhor do ano, não tem nada que supere, eu acho ela maravilhosa, é uma mega referência, uma mega inspiração, uma artista incrível.
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